Despedida é fardo pesado - sentimento condensado.
Retira um do outro em olhar desesperado.
Cada último toque quer se tornar penúltimo, todo olhar desvia do outro
por medo de encarar o que vai deixar.
Enfatizada pela distância que irá se criar, sente-se em poucos segundos o peso
do não saber se irá reencontrar.
Despedidas para breves ou longos momentos, não importa.
Em uma despedida a distância de quem se ama se traveste de fim do mundo e ali ficam os dois, imóveis - ninguém quer ser o último a olhar para trás.



Nasci em outra cidade, ela não existe mais e seu nome ninguém mais chama.
Queria saber por onde passeiam agora quem por lá passeava, onde foram
os restos das pedras que cobriam a rua de terra. Os restos do que fui.
Guardo na memória uma livraria, uma rua que asfixiei de silêncio, o cheiro dos dias nublados e cada estação que desmontava-se sobre mim. Escuto uma música que ninguém mais ouve.
Falo desses instantes em um grito que se lança - rompante.
Descontrole desesperado por controle.
Mas deixei ir, não era algo. Agora é nada.
Acolhi outro lugar, coloquei as mobílias e espalhei os tapetes. Aqui a luz se dissolve nas janelas, reflete nos espelhos mostrando a melhor parte do que encontrei. Portas só abrem para reencontros, nunca despedidas. Aqui, atalhos não são necessários, pois todos os caminhos levam para o lugar onde quero ir. Nasci em outra cidade, mas foi aqui - em ti- que me encontrei.
escolhe calar
cair

esconde o pensar
virar

não suporta o peso do pesar,
do que que não consegue acreditar.
então se desprende
e desaba.

sobra o ruído da voz quebrada.






tenho músicas favoritas,
cada uma pertence a um momento.

algumas parecem ter sido feitas propositalmente
para encaixar em um segundo específico.
no segundo específico em que teus dedos
se entrelaçaram aos meus pela primeira vez, por exemplo.

lembro da cena; do barulho que o sereno da noite fazia,
dos ruídos dos passos na estrada,
da tua mão apertando a minha, naquela curta caminhada.

fiz o caminho ser mais longo
no desejo de fazer o momento eterno
e assim tornou-se, até aqui.

três meses de eternidade
e o que vier depois dela.



















Acertos

Eles caminharam lentamente para cruzar o rio. Nadaram quando necessário e quase foram puxados pelo peso da correnteza. Correnteza que os manteria distantes um do outro. Mas, seus pés sobre o solo foram mais fortes e logo estavam os dois, de um mesmo lado da margem. Caminharam juntos para longe do rio.
Para perto do mar - essa grande cortina que abraça o abismo.
Eles ouvem pedidos vindos da água. Ele a observa. Ela deita na areia e espera até o início da manhã. Quando a ressaca do mar traz de volta o que levou. Depois levanta e junto com ele caminha para longe do mar. Para mais perto de outro caminho que resolveram trilhar. 
Caminham por uma estrada. Uma estrada ladeada por pinheiros. Pinheiros que arqueiam vez ou outra com o balanço que o vento faz. Ouvem o canto dos pássaros, que sossega o ouvido e arranca de si seus ruídos. 
Não contaram os dias, apenas caminharam. 
Pouco falaram, apenas observaram - os pinheiros, as pinhas nos pinheiros, a estrada, a terra na estrada, o ruído de seus passos na terra da estrada, o ruído dos passos do outro, o ruído do vento nas árvores mais frágeis, a fragilidade do silêncio quando a noite chegava, o olhar que incendiava, quando um ao outro tocava.

Depois de um mês inteiro andando, já não sabiam mais para onde estavam indo - e não se importavam muito com isso. Não diziam um ao outro, mas sentiam que ao andarem juntos faziam o caminho parecer mais leve.

o movimento sutil que teus olhos fazem ao piscar
que causa estrondo grandioso aqui dentro 
um intervalo e outro de tempo
do tempo que teus olhos levam para observar

o som que teus cílios fazem ao encostar nos meus dedos
de algo que ecoa, ressoa
com força tal de uma luz, que destoa
e destona do quanto sinto por ti

o que acontece aqui destona do que já senti
destoa de tudo que já vivi
é algo que ecoa, ressoa
é desejo resoluto
mais forte que acorde diminuto
é amor, profundo e bruto




Se alguém estivesse escrevendo nossa história,
nós seríamos um romance, um romance que nem Shakespeare
no melhor dos seus dias teria escrito.
De uma margem até a outra nossos diálogos seriam em cor,
sem nenhum tipo de dor.
Em desatino por não poder trazer suas tragédias,
em menos de duas páginas ele desistiria.
Nossos personagens facilmente se ligariam,
feito nuvem no céu em dia de ventania.
Fernando Pessoa não conseguiria transformar-nos em
um texto sonoro o bastante, então, as páginas em suas mãos
teriam que ser preenchidas pelo som de cada palavra
que endereçamos um ao outro. Hora ou outra em verso e rima.
Machado de Assis ao tentar nos escrever acabaria por
desistir de espalhar a dúvida entre Capitu e Bentinho.
Escreveria um romance que ficaria conhecido pelas certezas.
Página após página ele construiria com palavras
a fortaleza que se cria em um encontro.
Um encontro depois de tanto desencontro.
Não falo desse desencontro feito pra filme da Sofia Coppola,
que te leva ou não para uma garagem num sábado à noite ou
que te faz ou não conseguir uma carona para viajar - esse desencontro que faz
ou não um ao outro, encontrar.
Falo do desencontro da gente com a gente mesmo, esse que te faz esquecer
por qual caminho tu quer passar, que te arrasta para um lugar
em que tu não quer estar - porque quando a gente se encontra primeiro em si,
consegue então exergar no outro o que sempre quis encontrar.
Por isso digo que se alguém estivesse escrevendo nossa história,
nós seríamos um romance, um romance que com certeza
nem Shakespeare no melhor dos seus dias teria escrito.






estive em ti por tempo demais
me perdi em mim, tanto tempo faz
guardei o que tu foi 
cada canto que pisei 
em terra e mar 
na minha ilha de edição particular 
minha memória, fez eu te lembrar 
e assim como chegou 
também partiu

você era um tipo de luz
que só refletia
um tipo de grito
feito para as multidões
você era um pássaro de papel
feito para abater
era praia
sem nunca escurecer
e hoje que não és nada
e nem deixasse de ser
deixo ressoar por dentro
o que eu, sozinha, escolhi ser

Eu te amo e se pudesse te amaria em outra vida. Na próxima e na anterior.
Nasceria contigo em tantas vidas quanto fosse possível, até passar da cota de vidas juntos e se a cota não existir, melhor ainda, que então seria uma eternidade de vidas contigo e preciso de todas elas pra te conhecer inteiro; cada canto desse teu que se junta tão bem ao que é meu.
Quero descobrir tuas manias vida após vida, aceitar teus defeitos dia após dia, te ver cantando com olhos fechados tuas músicas preferidas em todo final de ano e conhecer tuas músicas preferidas daqui mil anos e dividir contigo as minhas - e te mostrar que não importa quantas vidas passem, sempre vou conhecer mais músicas do que tu.
Quero te ver jornalista e escrevendo teus poemas em uma mesinha de frente pra janela, enquanto chove lá fora, em uma manhã de primavera. Quero nascer contigo no norte do Brasil, passar calor o ano inteiro, deitar na rede no domingo e saber tocar acordeon. Quero outra no interior da Itália, com plantação de flor na frente de casa e janela de madeira meio lascada. Quero uma na Índia, nessa vamos nos conhecer na infância e o amor surgirá por circunstância. Em outra vamos morar no Japão e reconhecer um ao outro num esbarrão, em uma daquelas faixas de segurança cobertas pela multidão.
Quero nascer em todos os lugares do mundo contigo, ouvir tua voz falando rápido em todos os idiomas possíveis e repetir toda vez pra tu falar mais devagar e lembrar toda vez que tu parece o homem no comercial do remédio que diz "este medicamento é contra-indicado em caso de suspeita de dengue" e sempre pensar que nosso amor é completamente-indicado em caso (da menor) suspeita de encontro porque em cada vida que eu te encontrar,
na primeira vez que te olhar,
tudo em volta vai parar
e assumir outro lugar,
esse é o sinal que a vida vai mandar,
dizendo sempre
que tu foi feito pra eu amar.
feito enfeite
me decora
por dentro e por fora
me ancora
em mar aberto
me traz pra perto
colore céu, colore estrada
faz do abraço minha morada


Eu e ele nos fundimos como iguais
Mas ele é vento, ventania que arremessa
Eu sou brisa suave, sem nenhuma pressa
Ele é faísca que lampeja
Eu, chama de vela, no máximo meio acesa
Ele é acorde diminuto que não tem resolução
Eu, acorde dissonante à procura do tom
Ele é arranha-céu, minha morada pra vida inteira
Eu casinha de esquina, daquelas bem pequenas
Eu e ele nos fundimos como iguais,
sem lembrar das diferenças,
essas que nos tornam um para o outro ideais.

o medo que você carrega


- e o medo que você sente
não é medo que você sente
é só culpa do que nós compartilhamos
e quando você no meio da noite
se esconde dentro de si
acaba por perder o que é bonito
no início da manhã
e me perde
e me perco
do motivo de estar ali
então deixa isso em algum canto
algum com vista bonita
se encontre dentro de si
me encontre dentro de ti
permaneça dentro de mim.-





contruímos cada um
um mapa
o meu te leva a tua parte
o teu te leva a minha
ele inteiro nos leva a algum lugar
e entre uma volta e outra
nos leva ao encontro um do outro

tu és a minha nova síntese do mundo



tenho ouvido para o descabido
pra tudo que atormenta por dentro
e atinge o peito, no centro
pra tudo que confunde e me funde
contigo, me inunde

ouço cada palavra tua
si la bi ca men te separada
gramaticalmente acentuada
foneticamente atormentada

ouço o gesto teu
que rima hora ou outra com o meu
ouço o que tu me escondeu
o último sorriso que tu me deu

ouço teu passo incerto
que traz pra perto
o que há pouco foi descoberto
e assim me conserto
no concerto que é ouvir que tu existe.








espero
e me desespero
em algum descuido
me despercebi
quando te vi
não gosto de como me perco fácil
quando alguém me encontra





tocar teu rosto
é igual fechar os olhos e sentir o vento de fim de tarde
é como sorrir depois de chorar por muito tempo
ou como quando a luz volta depois de horas no escuro.
é cesta de três pontos no basquete e
gol do Brasil no final do segundo tempo.
é segurar xícara de café com as duas mãos
e colocar casaco quente depois de andar na noite fria
é banho quente no inverno
e banho de chuva no verão
é pisar em folha de outono que estrala
andar no meio fio até o fim, sem desequilibrar
rodopiar a diagonal inteira do balé sem tontear
é noite de verão pra ficar de frente pr'o mar
é como deitar na grama em tarde ensolarada de inverno
olhar pela janela do ônibus quando tudo está deserto
analisar gente estranha de passo incerto
é ficar sozinho quando quer
ou ter alguém do lado quando precisa

(tocar teu rosto é quase tão bom quanto te ter comigo)








Conta pra ele da batida dissonante que é sentir a falta dele.
Do som que ressoa, ecoa
toda vez em tua mente
e que esse som é o da voz dele
e que a voz dele tem um tom que é o melhor que tu já ouviu.
Conta pra ele que sonhou com ele na noite passada,
mas que foi com os olhos abertos
enquanto atravessava a rua.
Conta pra ele que todo toque dele em ti te arremessa
do Círculo Polar Ártico ao deserto do Atacama.
Que quando ele segura a tua mão tudo em volta destoa
destona, se faz dissonante.
Conta pra ele que quando ele te abraça tu se sente deslocar por dentro
e que teu coração sai do compasso.

Conta pra ele.


Eu queria te entregar um milhão de palavras,
empilhadas, amontoadas, te soterrar delas até perto de cortar tua respiração.
Queria escrever elas em todos os muros no caminho da minha casa até na tua.
Acho que faltaria muro e faltaria palavra; mesmo pra mim que sempre me achei tão cheia delas.
Acabei por perceber que existe gente que é maior que qualquer palavra, gente que por si só é poesia, poema inteiro, daqueles com rima e métrica.
Gente que quando fala é mais bonito de ouvir do que um da Cecília Meireles, que quando encosta o toque, toca mais que um do Fernando Pessoa e que quando sorri estremece tudo por dentro, feito um dos sonetos do Neruda. Não sabia da existência de gente como tu, gente que não tem palavra pra explicar o que é sentir perto. Que faz parecer que de todas as palavras do mundo a mais bonita é substantivo próprio, com letra maiúscula em todas as quatro palavras do teu nome. 






Eu não acreditava que tu chegaria.
Afirmei por um bom tempo e com muita convicção, para o vento que quisesse ouvir. Porque não havia o que pudesse tirar de mim o emaranhado todo onde havia me colocado, era raiz demais, de memória demais, era terra demais, água demais, de choro demais e que de tanto demais já não era mais meu, já nem era mais eu.
Eu não acreditava que tu chegaria.
E por não acreditar, acostumei, conformei. Permaneci no emaranhado aqui de dentro.
Fiz dele casa. Morada pra viver de sonho que não acontece. Tranquei por fora e por dentro janelas e portas, pra impedir qualquer sinal de sonho novo.
Eu não acreditava que tu chegaria.
Enquanto eu me encarava no vidro da janela do ônibus, aquele das 17:40 que se atrasa toda vez - que no fundo gosto de pensar ser um atraso proposital, porque o motorista sabe, assim como eu, que se ele não atrasar não consegue pegar os últimos raios de sol, uns que refletem bonito, feito em cena de filme do Spike Jonze- ou enquanto eu escolhia o terceiro banco da fila da direita, porque de lá da pra ver o pôr-do-sol por mais tempo, entre um afastamento de montanha e outro.
Ali também eu não acreditava que tu chegaria. Não acreditei até o momento exato da chegada.
Porque ali não teve espaço pra acomodar dúvida. Porque era. Deu pra sentir por dentro e por fora.
O emaranhado sentiu também, perdeu espaço e saiu pelas portas e janelas que se abriram. E o que era meu voltou a mim. E o que era teu ficou em mim. E preencheu e se alastrou por dentro.
Eu não acreditava que tu chegaria, mas ainda bem que tu chegou.

Tirei a batedeira da bolsa pra colocar eletrodoméstico ainda mais pesado no lugar.

difícil como tirar uma batedeira da bolsa

eu olho
olho de novo
olho mais uma vez
e incontáveis
as nossas poucas memórias
e não aguento mais olhar pra elas
olhar pensando que não fazes o mesmo
olhar sabendo que as olho sozinha
olhar e ainda que triste, sorrir
porque olhar é lembrar
e lembrar é ter perto
mesmo que longe
e não aguento mais
estar longe
e sentir falta
e achar que não precisar esquecer
vai doer menos
quando eu sei que não vai
e querer esquecer
e num rompante de coragem pedir ajuda
pra deus, pro cara do posto, pra senhora da feirinha
se eles podem me livrar disso
de você
porque não tenho mais forças pra continuar te amando
e mesmo assim te amo
O que a vida fez conosco?
não com quem você é
ou quem eu sou,
mas com nós. Comigo e contigo.
Com você andando ao meu lado,
observando o chão como se ali morasse o universo inteiro
e eu andando ao teu lado,
te observando observar o chão com o universo inteiro.
O que ela fez conosco e as músicas que cantamos juntos, 
o que ela fez com os sorrisos que apareceram
em momentos que só nos era cabível chorar,
o que a vida fez conosco?
com eu e você
com tu e eu
e com todas as palavras que poderíamos ter dito
um ao outro e não dissemos?
Nos faltou um pouco mais de tempo,
nos faltou menos erros, mais acertos e talvez quem sabe um pouco de sorte.
O que a vida fez conosco?
não com quem você é
ou quem eu sou,
mas com nós. Comigo e contigo.
Com você andando ao meu lado,
observando o chão como se ali morasse o universo inteiro
e eu andando ao teu lado,
te observando observar o chão com o universo inteiro.
O que ela fez conosco e as músicas que cantamos juntos, 
o que ela fez com os sorrisos que apareceram
em momentos que só nos era cabível chorar,
o que a vida fez conosco?
com eu e você
com tu e eu
e com todas as palavras que poderíamos ter dito
um ao outro e não dissemos?
Nos faltou um pouco mais de tempo,
nos faltou menos erros, mais acertos e talvez quem sabe um pouco de sorte.
Uns dias atrás comecei a dizer em voz alta que sinto a tua falta. O universo parece contribuir para que eu me lembre de você; Beach Bummer toca em algum lugar ou o verde de alguma árvore chega aos meus olhos assim como teus olhos chegavam -  é aí que sorrateiramente o "sim, ainda sinto a tua falta" se desprende de mim e ecoa.
É difícil admitir depois de tanto tempo. É difícil admitir que tu ainda és parte de algo aqui dentro.
Pensei que ecoar os sentimentos me ajudaria a esquecer mais rápido o que precisava ser esquecido, afinal o ser humano tem orgulho, não tem? Ninguém gosta de se sentir fraco enquanto o causador de sua fraqueza, se encontra forte. Ninguém gosta da sensação de sofrer por alguém que não se sente na obrigação de sofrer por ti também. O problema é que esse tipo de escudo protetor sempre foi pesado demais para mim e não sei porque pensei que seria diferente se tratando de você; transformar amor em mágoa, sofrimento em orgulho ferido nunca foi meu forte. Decidi que o melhor seria olhar com carinho para todas as memórias, essas pequenas que vez ou outra passeiam por meus olhos;
feito as luzes coloridas daquele karaokê que te iluminaram hora sim, hora não. Não sei quanto tempo isso vai durar e nem tenho certeza que vá um dia terminar, de qualquer forma estou feliz por sentir tua falta.
Uns dias atrás comecei a dizer em voz alta que sentia a tua falta - o universo parece contribuir para que eu me lembre de você; Beach Bummer toca em algum lugar ou o verde de alguma árvore chega aos meus olhos assim como teus olhos chegavam e é aí que sorrateiramente o "sim, ainda sinto a tua falta" se desprende de mim e ecoa.
Pensei que ecoar os sentimentos me ajudaria a esquecer mais rápido o que precisava ser esquecido. Imaginei que o exercício de admitir sentimentos em voz alta, ativaria algum tipo de alavanca do meu corpo que consequentemente abriria as comportas do orgulho, afinal o ser humano é orgulhoso, não? Ninguém gosta dessa sensação de sofrer por alguém que não sente a menor obrigação de sofrer também, não por você pelo menos.
O problema é que esse tipo de escudo protetor sempre foi pesado demais para mim e não sei por que pensei que seria diferente se tratando de você; transformar amor em mágoa, sofrimento em orgulho ferido, nunca foi meu forte.
Percebi que o melhor para mim seria olhar com carinho para todas as memórias, essas pequenas que vez ou outra ainda passeiam por meus olhos; feito as luzes coloridas daquele karaokê,
que te iluminaram hora sim, hora não, na noite em que te conheci.
Não sei por quanto tempo isso ainda vai acontecer e nem se deixará algum dia de acontecer,
de qualquer forma estou feliz por sentir tua falta. E de perceber que ainda és parte de algo aqui dentro.

fiz uma playlist de "músicas que queria te mostrar"
porque todo dia encontro uma música nova,
dessas que tenho certeza que tu amaria e até colocaria na tua playlist 
como não posso mais te mandar 
tenho colocado todas elas lá
na esperança de que um dia tu as ouça
ou talvez de que um dia eu pare de encontrá-las
nunca me importei muito com o sofrimento padrão
amar sem ser amado
a reciprocidade é bonita, mas não vejo a falta dela como das maiores tristezas
sinto que me incomoda bem mais o deixar de sentir
arranca-te pedaços maiores, é uma tristeza a conta-gotas
é como se cada dia fosse uma última pequena chance
de que tudo aquilo que se sente não vá embora
mas pra onde vai tudo que se sente quando se deixa de sentir?
e como acontece isso
de um sentimento sumir?
existe algum sintoma físico?
com duas toneladas de amor indo embora, algo tu deve sentir, não é?
pode ser que aconteça durante uma conversa com teus amigos,
naquele parque que tu tanto gosta.
tu vai sentir um solavanco tão forte por dentro
que te fará cair de costas na grama,
todos te olharão assustados, mas você levantará prontamente,
limpará os pedacinhos de grama que se prenderam ao casaco
e continuará falando como se nada tivesse acontecido.
ou não?
talvez esses sentimentos não gostem de se despedir com solavancos
preferem ser discretos e desaparecerão enquanto estás distraída
esperando o troco no caixa da padaria.
talvez te doa o coração, talvez te faça cócegas nas pálpebras
talvez tu chore depois ou talvez dê risada.
não se sabe.
eu particularmente acredito que esses sentimentos bonitos
tem cara de que se aproveitam de momentos específicos, como quando
a poça da chuva molha tuas meias e tu não consegue pensar outra coisa além de
"não acredito que vou ter que ficar o resto do dia com as meias molhadas"
espero que seja em um momento assim quando acontecer comigo.




sinto a tua falta
todos os dias vivo
como vivia antes
e a cada dia parece
tornar-se
menos possível
porque quando eu olho pro espaço
eu estou olhando pra você
e posso te ver vivendo seus momentos
quero arrancar-te de dentro para fora
viver sem te ter por dentro
não sei porque ainda me demoro
já é outono lá fora
mas tu ainda faz meu coração sentir
como se fosse verão

lembro como seu cabelo não estava longo quando nos conhecemos
e como ele chegava já mais perto do teu coração quando nos despedimos
lembro das anotações do teu nome na agenda 
de enfrentar naufrágos 
e de perder a razão, o orgulho, os óculos e a mim mesma.
lembro de voltar pra cama sozinha, e saber que ainda assim estavas lá,
em outro lugar.
quando penso que nenhum livro contará a nossa história
que em nenhum lugar estará registrado
a não ser em nossas memórias já tão cansadas
me desespero em anotar e não nos fazer esquecer.

espero que daqui algum tempo ao cruzar alguma rua, 
lembre de mim,
num dia de céu claro ou de vento fraco
e lembres do primeiro dia de nossas vidas
nascemos juntos naquele refrão
que demorou pra ser 
tornamo-nos o outro 
na estrofe seguinte

você é a vida da minha vida


Eu sinto sua falta.
Sinto falta das suas pálpebras
De quando corro os dedos por elas.
Das conversas quando o quarto já está escuro.
Sinto falta daquele seu meio sorriso - ele acontece antes mesmo de você abrir os olhos.
Sinto falta de reclamar do calor
e do vento do ventilador.
Sinto falta da segurança das suas mãos,
do encaixe com elas,
e dos seus dedos passeando por mim,
que me encostam, tocam: a carne e alma.
Sinto falta de você nunca estar com sono quando eu pergunto
e sempre perguntar mesmo já sabendo a resposta.
Sinto falta da sua música
do seu cabelo no rosto enquanto toca,
e do seu cheiro no travesseiro.
Sinto falta até das suas partes insuportáveis.
Havia o medo da partida desde o primeiro encontro.
Sempre pairou desconfiança - porque era perfeição demais.
Combinavam em tudo.
Tinham as mesmas feridas
- que conseguiram cauterizar ao mesmo tempo
ao primeiro olhar.
Compartilhavam emoção, brisa, vento, vendaval.

O cenário todo simples.
Nem mais nada era necessário.
Sequer plateia.
Estavam sós e nem precisavam dizer isso aos outros
- o que por si só é prova de maturidade.

E apesar de tudo tinham medo.
Medo da falta de obstáculos.
Medo de não sofrer, ou de temer que o sofrimento viesse.

A cada dia passeavam por uma linda alameda
que conduzia a outra, ainda mais bela.
E, a cada dia, a insistência da paisagem provava que estavam
errados.

Se a atração dos opostos é regra, eles eram a definitiva exceção.

E mesmo assim, cada um a seu modo,
auguravam algum antigo ensinamento
de que tempestades são sempre visitantes sem-cerimônia.

Prosseguiam, sem incomodar o sonho alheio,
mas de certo modo sem conciliar o próprio sono.
O tempo, ainda bem, mostrou que de fato estavam errados.

                                                                     

Das perdas

A angústia de pensar que eras parte de mim e partirias.
Dentre as partes eras daquelas gigantes, ocupava um lado inteiro daqui de dentro.
Aos poucos a angústia de perder-te perdeu forças para a ansiedade, a ansiedade de ter-me de volta.
Ganhar de volta o espaço que tu ocupava e poder preenchê-lo com a felicidade que mais me enternecesse, seja ela qual fosse.